terça-feira, 6 de novembro de 2012

Plic-Plec * Tic - Tac



..."...há quem fale com as paredes. Em rapaz lera um romance de um escritor então muito lido, e mais tarde injustamente menosprezado, um tipo com nível, que em certas coisas ia direito ao assunto e que nesse livro falava com o seu próprio corpo, ou antes, com um ponto bem preciso do corpo, a quem chamava o seu "ele", para entabular um diálogo que nada tinha de banal. Mas aqui o caso era outro, porque o seu "ele" não era para aqui chamado, e limitou-se por isso a dizer: perna,oh, perna! Moveu-a e a resposta foi uma dor lancinante. Não havia diálogo possível. Estendeu-a com toda a cautela e a dor concentrou-se na coluna. Coluna infame! Voltou a irritar-se. Pensou que se chamasse o médico, com o qual tinha doravante demasiada confiança, ele lhe diria que estava com um ataque de literatura, observação que já em tempos fizera. Parecia-lhe ouvi-lo: meu caro, o problema está sobretudo no facto de adoptares posições incorrectas  ou melhor, de teres adoptado em toda a tua vida posições incorrectas quando escreves, porque infelizmente o teu problema é escreveres..."...


do conto  Pic plec, plic pec *   de Antonio Tabucchi em O Tempo Envelhece Depressa













Há quem fale com as paredes. Por vezes as paredes sabem mais de nós do que aqueles que vemos todos os dias e a quem podemos estender as mãos num abrir e fechar de olhos. É muitas vezes num abrir e fechar de olhos que tudo muda. São demasiadas as vezes que, entre paredes a quem chamamos nossas,  nos sentimos melhor e quando nos faltam as paredes faltam as traves mestras que mantêm a estrutura fixa, imóvel, segura, forte.
A protecção é um conceito abstracto mas que , por motivos de sobrevivência consideramos simples e fácil de atingir. Como todas as outras coisas é projectada numa imagem que convêm manter inerte durante a vida, para que não se perca. Inerte porque se quer sem vida , já que a vida pressupõe mudança e é essa mudança que teremos sempre muita dificuldade em aceitar, mesmo que ao espelho nos vejamos como facilmente "absoventes" do que é novo.  Absorvemos, observamos, protegemos, simplesmente sufocamos, ou então adormecemos, fingindo tomar o ar que nos interessa, projectado na imagem que entretanto passou a sonho.
O sonho de uma noite de Verão ( as melhores de todas) e onde se pode falar com quem e de quem a nossa imaginação conseguir criar e aí sim podemos seguramente falar com as paredes... ti(c)-ta(c)...

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